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O piano triste de Blue Banisters e a poesia de Lana Del Rey

 

O piano triste de Blue Banisters e a poesia de Lana Del Rey



Lana Del Rey é um gênero musical. Sua estética, sua voz e sua escrita são atmosferas muito particulares e é muito comum que qualquer pessoa ao ser introduzida a discografia da cantora, consiga perceber toda sua dinâmica e crie visuais apenas nos seus primeiros acordes e sentenças. Seu oitavo álbum de estúdio nos mostra o que uma artista pode fazer após atingir seu ápice. Em Blue Banisters Lana Del Rey fala abertamente sobre seu cotidiano, seja quando menciona a gravidez da sua irmã Chuck Grant enquanto preparam um bolo de aniversário ou quando fala da sua relação conturbada com a mãe, mencionando-a como a esposa do seu pai em Wildflower Wildfire. Suas composições caminham em direção a suas fragilidades e medos, refletindo sobre as pessoas que estiveram próximas de si ao longo do caminho percorrido, mas também resgata antigos amores e toda sua energia depositada nisso. A sua fragilidade aqui é deslumbrante, com uma tendência embaraçosa em dizer coisas tão comuns de forma sedutora e quase palpável. O álbum carrega muito piano no primeiro momento, deixando a voz da Lana em ascensão, diferentemente do seu álbum anterior (Chemtrail over the country club) que incorporou muitos elementos do folk ao piano, o piano aqui é levado na maior parte da vezes com pouquíssimas notas enquanto a voz etérea da cantora vai criando corpo, reverberando pelos espaços com sofisticadas sobreposições. Lana também alcança novos lugares com sua voz, lugares que poderíamos julgar antes inacessíveis, tudo está num requinte celestial e maduro. A tristeza do piano é uma dádiva para que ela conte suas histórias de vida escritas como poemas bem elaborados. Arcadia evoca a cidade dos anjos mais uma vez e faz referência ao sonho idealizado da cantora pelo berço das estrelas, nessa faixa a cantora menciona o fato de precisar ir embora por não ser uma nativa, por ter oferecido apenas amor mas, ainda assim, ter sido erguida trezentos pés de altura apenas para ser derrubada, embora soe triste, a canção é, na verdade, mais uma carta de amor da Lana para Los Angeles, afinal seus versos iniciais dizem que seu corpo é um mapa de LA e ela está emocionalmente conectada a tudo aquilo. Algo nessa canção a faz parecer como uma trágica despedida, ela tem um piano perfeitamente ensaiado. Mas não, não temos apenas o piano triste no álbum, embora ele ocupe muita atenção, o disco tem uma mudança mais aparente a partir do Interlúdio-The trio faixa que conta com influência trap, mas também com uma levada Tarantinesca ou que remete a cenas cinematográficas de faroeste, a faixa tem sample da canção The Good, the Bad and the ugly do Ennio Morricone que está presente na cena de confronto final do filme Três homens em conflito. Lana trouxe produções grandiosas, como belíssimos back vocals na faixa Thunder, uma faixa viciante com ares californianos e violoncelos. A faixa Black bathing suit começa com o som de corvos sobrevoando o céu o que achei muito interessante e ainda faz referência a trilha do Morricone, resgata suas origens mais sombrias do Ultraviolence enquanto revela sentimentos de sua pesarosa quarentena, com um final confuso mas certamente arrebatador. E o que falar do final mágico de If you lie down with me? Uma belíssima orquestra de trompetes que nos transporta para clubes de jazz em new orleans. Em Living legend ao cantar sobre uma paixão tão intensa com instrumentais um pouco mais pesados, a produção encerra a faixa de forma extremamente satisfatória, sua voz gritada e distorcida até soar como uma guitarra elétrica, incrível e ousada. Dealer é um feat com Miles Kane um dos vocalistas do grupo The last shadow puppets, nessa faixa a Lana está apenas gritando durante o refrão com uma voz rasgada que a faz parecer bêbada em um Karaokê, foi uma surpresa muito boa. A antiga Lana Del Rey tão selvagem e apaixonada está de volta na faixa Nectar of the Gods trazendo muito dos seus primeiros trabalhos na sonoridade e na letra também. Já Violet for Roses conversa sobre um sentimento de esperança quando ela inicia falando sobre meninas em vestidos de verão sem máscaras, sentindo a mudança no ar com o fim da quarentena, emendando o fato de que estava apaixonada por alguém que a quer mudar e fazê-la trocar suas “violetas por rosas”, sendo arrebatadora ao dizer que “Deus sabe que o único erro que um homem pode cometer, é tentar fazer uma mulher mudar” e Beautiful é tão glamourosa, precisa em cada detalhe de sua melodia e composição, resgatando o período azul do Picasso e fazendo referência à sua arte. A faixa de encerramento é a amorosa Sweet Carolina que conta com a participação do seu pai Robert Grant e de sua irmã Chuck Grant durante o processo de gravação e criação da música, produzida em 20 minutos e gravada em 1 take é uma forma honesta e genuína de encerrar um álbum que mencionou abertamente várias pessoas presentes em sua vida e diálogos que teve com elas, uma canção para acolher sua irmã e a chegada da sua sobrinha. Esse novo material entrega uma grande ênfase nas palavras e na narração de histórias, ora com uma sofisticada produção de piano ora com trompetes, harpas e turba. Lana Del Rey está no cânone do alternativo, ela não é apenas uma cantora pop, ela é uma cantora alternativa que influenciou uma geração e abriu caminho para nomes que hoje são considerados grandes na indústria, ela pavimentou um caminho íngreme e criou um nicho que tem força para manter-se no mainstream mesmo sem seguir as regras para alcançar o mesmo.

Nota: 92/100

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